20070303

Grão de bico

Sem se dar conta das consequências ou até talvez sim mas pensando estar no controlo da situação, Grão de bico deixou-se levar pela magia da Rota dos Beijos. Dadas as circunstâncias, seguir a Rota dos Beijos era como que um caminho proibido e consoante os passos dados poderia encontrar o pote da felicidade ou então cair num abismo de mágoas. Algo começara a crescer no coração de Grão de bico que o impelia a prosseguir a Rota dos Beijos, era algo, embora ainda embrionário, muito genuíno e verdadeiro. A caminhada de Grão de bico foi-se preenchendo de alegria, excitação, euforia e de uma esperança tamanha de não lhe caber no peito. Aquela semente no coração de Grão de bico expandia-se com toda a força. Encontraria Grão de bico o pote da felicidade? Como em todos os contos e estórias surge o lado mau, o lado negro e esta não é excepção. A sombra no caminho de Grão de bico eram as tais "dadas circunstâncias" que levavam Grão de bico a ponderar as suas opções, a indagar se prosseguir a Rota dos Beijos o levaria mesmo a encontrar o pote da felicidade. A sombra foi crescendo com as suas dúvidas de tal forma que a sua caminhada foi-se tornando penosa. Grão de bico ainda encontrava alegria debaixo de cada pedra do caminho, excitação nas flores que desabrochavam à sua passagem, euforia nas asas dos pássaros que o acompanhavam e até mesmo a esperança, essa no âmago da semente entranhada no seu coração. Hoje Grão de bico tem umas pontadas no coração, sempre que revira uma pedra e não encontra aquela alegria, sempre que uma flor desabrocha e aquela excitação não se liberta, sempre que um pássaro lhe faz um vôo rasante e nas suas asas não traz aquela euforia. As pontadas são a esperança aprisionada na semente ressequida do coração de Grão de bico, debatendo-se ao pressentir os pássaros, as flores e as pedras. O que aconteceu a Grão de bico para carregar tal dor no coração? Bem, parece que a sombra foi crescendo e Grão de bico, como que num jogo de esconde-esconde, correu pela Rota dos Beijos afora, mergulhou em moitas sustendo a respiração para não ser descoberto, empoleirou-se em galhos de árvores altas para não ser apanhado. Mas um dia, desavisado pela visão de uma acrobacia eufórica de pássaros a sombra veio por trás e entrelaçou-se em todo o seu ser e Grão de bico cedeu. Seguiu outra direcção, diferente da da Rota dos Beijos, também ela com alegrias, excitações, euforias mas essas com um sabor diferente. A esperança? Filósofos(*) há que dizem que a esperança é um sonho acordado ou que enquanto há vida há esperança. Gosto especialmente da descrição da escritora(**) que diz que a esperança é a coisa com penas, que se empoleira na nossa alma, cantando a melodia sem as palavras e que não acaba nunca. Quanto a Grão de bico, só o seu coração encerra essa verdade.





(*) Cícero e Aristóteles
(**) Emily Dickinson

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